Trabalho coordenado pela FAO (Food and Agriculture Organization of the United Nations), destaca o “grande potencial inexplorado ” de seqüestro e armazenamento de carbono nos solos sob pastagens dos sistemas pastoris e agropastoris das regiões secas do planeta. Com o título de Review of evidence on drylands pastoral systems and climate change - Implications and opportunities for mitigation and adaptation, o texto editado em novembro de 2009, apresenta o manejo de pastagens como a “segunda mais importante tecnologia agrícola atualmente disponível para suavizar as alterações climáticas”. Para os autores - Constance Neely, Sally Bunning e Andreas Wilkes - a evidência deste potencial exige esforços coordenados e mecanismos de intervenção global nas barreiras sócio-político-económicas, que têm implicado na marginalização do setor . O estudo também destaca o valor da flora de sequeiro, que desenvolve mecanismos únicos para lidar com a baixa e irregular precipitação. A vegetação nativa destas regiões é altamente resistente às secas , recuperando-se rapidamente de incêndios e da pressão de pastejo. Tais atributos têm grande significado para o ecossistema global , especialmente no contexto atual de mudanças climáticas.
No estudo os pesquisadores alertam para o fato de que as terras predominantemente utilizadas para a produção animal são áridas ou semi-áridas, portanto , particularmente sensíveis à degradação , como é o caso da África subsaariana , que tem 40 % de seu território dedicado à pecuária. Estas pastagens exigem grande atenção , não só pela “degradação generalizada” que apresentam e que determina uma menor capacidade de recuperação à seca e a desertificação , mas também pela sua capacidade potencial de seqüestro e armazenamento de carbono . As maiores oportunidades para seqüestro de CO2 no solo estão, justamente , em terras degradadas. A degradação significa que o solo esta longe do ponto de saturação e que , portanto , pode capturar e armazenar muito mais carbono .
O conceito de “seqüestro de carbono ” foi consagrado pela Conferência de Quioto, em 1997, como um mecanismo capaz de reverter o acúmulo de CO2 na atmosfera , visando à diminuição do efeito estufa . Na fase de crescimento as plantas funcionam com verdadeiros “aspiradores ” de carbono . Pela fotossíntese elas “capturam” o CO2 do ar , usando-o para compor suas folhas , caules , raízes e sementes que recebem o nome de biomassa . O carbono entra no solo através das raízes e da biomassa em decomposição . Parte deste carbono volta para a atmosfera , mas boa parte permanece no solo . Os fungos , bactérias e outros micro-organismos que ajudam na decomposição do material orgânico são , também , uma forma para que o carbono orgânico permaneça no solo . Os solos representam, portanto , um grande “depósito ” de carbono . O IPCC - Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima - relata que o seqüestro de carbono pelo solo é capaz de compensar entre 5 a 15% das emissões globais deste gás . Só o potencial de seqüestro das pastagens brasileiras é estimado em 70 milhões de toneladas de C por ano (FAO LEAD , 2006). Recuperar os solos sob pastagens poderia também , compensar quantidades significativas das emissões globais de metano (outro importante gás do efeito estufa ), pois a melhoria da qualidade das pastagens resultaria em maior produtividade animal e conseqüente redução na proporção de energia perdida como CH4.
O fator chave responsável pelo armazenamento de carbono em pastagens é a absorção via raízes das gramíneas . Para alcançar os objetivos de seqüestrar carbono e reverter os processos de degradação dos solos, o produtor dispõe de várias práticas como o controle dos processos erosivos, evitar as queimadas, sistemas agroflorestais e técnicas de manejo que considerem um tempo de descanso da terra suficiente para a recuperação de áreas superpastejadas. O bom manejo começa pela compreensão de que se deve utilizar a biomassa vegetal para alimentar , não apenas os rebanhos , mas também os organismos do solo , e assim , estimular as gramíneas a crescerem vigorosamente , desenvolvendo raízes saudáveis .
Darwin afirmava que se as árvores tivessem um cérebro deveríamos procurá-lo nas raízes e Voisin sustentava que o pasto é efetivamente criado por suas raízes. Raízes profundas e vigorosas proporcionam vários benefícios , incluindo a aeração do solo , controle de erosão , ciclagem de nutrientes , construção do solo , aumento da capacidade de absorção e retenção de água . Elas também fornecem habitat e substrato para os organismos do solo , como as bactérias fixadoras de nitrogênio . Com um sistema radicular vigoroso as forrageiras conseguem produzir biomassa suficiente , não só para alimentar os rebanhos , mas também para a produção da “geléia bacteriana” que “cola ” as partículas do solo em grumos . Um solo grumoso e estruturado, torna menos penoso para a planta a adversidade do clima seco com chuvas mau distribuidas. A bioestrutura é fundamental não apenas para que as chuvas esporádicas consigam se infiltrar e permaneçam armazenadas à disposição da planta , mas também porque o volume de solo explorado pela raiz será maior , e a planta poderá alcançar a água em camadas mais profundas. Por esta razão , a pioneira da agroecologia no Brasil, Ana Primavesi considera que os capins são “os melhores renovadores da bioestrutura e com isso da produtividade do solo ”.
Alterações climáticas, perda da biodiversidade , seca e desertificação são fenômenos inter-relacionados e reflexos das agressões praticadas pelo homem ao ambiente . Como produzir alimentos para a população mundial em crescimento , sem agredir o meio ambiente é o dilema dos dias atuais . Trata-se de perseguir um duplo objetivo : produtividade e conservação dos recursos naturais . Não é possível proteger o meio ambiente na ausência de crescimento , tampouco podemos crescer esgotando o patrimônio natural não renovável. Se bem manejadas, e para isso é fundamental manter a diversidade vegetal num equilíbrio dinâmico buscando a máxima semelhança possível com a vegetação nativa , as pastagens do semi-árido podem prestar um duplo serviço : primeiro um beneficio ambiental, seqüestrando carbono , e aumentando a capacidade das regiões secas em adaptar-se aos impactos das mudanças climáticas em curso , depois um benefício econômico , reforçando a produtividade da pecuária e a segurança alimentar das populações .
José Caetano Ricci de Araújo
Eng° Agrônomo e Produtor Rural
Ipirá – Bahia
Artigo publicado no Jornal A Tarde em 27/03/2010.
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