14 de jun. de 2011

O QUE É GEORREFERENCIAMENTO?

            Em 1973 o Ministério de Defesa dos EUA deu inicio ao projeto NAVSTAR-GPS, um sistema de rádio navegação inicialmente concebido para fins exclusivamente militares com o objetivo de obter a posição exata, em tempo real de homens, veículos, aeronaves, mísseis, navios, etc. Algum tempo depois este sistema foi liberado para uso civil e hoje, já se tornaram bastante conhecidos os receptores de mão chamados de GPS (Global Positioning System).
            Modernos softwares (instruções que controlam o funcionamento de computadores) permitem O USO DESTE SISTEMA GLOBAL DE NAVEGAÇÃO POR SATÉLITES, também PARA ELABORAÇÃO DE CARTAS, PLANTAS OU MAPAS, o que é denominado de GEORREFERENCIAMENTO.

            São inúmeros os tipos, os recursos e a precisão destes aparelhos, usados por: cientistas, agrimensores, guardas florestais, engenheiros, geólogos, arqueólogos, ciclistas, balonistas, pescadores, ecoturistas ou até leigos que queiram apenas planejar e se orientar durante suas viagens. Existem desde os receptores populares, usados para navegação, lazer e levantamentos aproximados, até, em ordem crescente de precisão: os topográficos, os geodésicos e os de uso exclusivo da Defesa Americana. Por traz desses pequenos aparelhos esta uma imensa estrutura de satélites espaciais orbitando ao redor do planeta e de estações de controle, espalhadas pela terra em pontos estratégicos.

A PRECISÃO OBTIDA COM OS APARELHOS POPULARES É MUITO BAIXA (ERROS DE DEZENAS DE METROS), por isso, levantamentos topográficos efetuados com este tipo de aparelho, não merecem nenhuma confiança e NÃO SÃO ACEITOS PELA LEGISLAÇÃO.

            A rigor georreferenciamento é uma técnica da agrimensura, no entanto, o termo passou a ser usado no sentido do CUMPRIMENTO INTEGRAL DA NOVA LEGISLAÇÃO AGRÁRIA. Como tal, o georreferenciamento foi instituído em nosso sistema jurídico pela LEI 10.267/2001. De acordo com esta nova legislação o georreferenciamento se tornou OBRIGATÓRIO PARA TODOS OS IMÓVEIS RURAIS DO BRASIL tendo duas finalidades básicas, servir de:

1. Instrumento de REGISTRO PÚBLICO, possibilitando a segurança no tráfico jurídico de imóveis.

2. Instrumento de CADASTRO, com a finalidade predominantemente fiscalizatória.


            O GEORREFERNCIAMENTO COMO INSTRUMENTO DE REGISTRO PÚBLICO

            O trabalho desenvolvido pela Comissão Parlamentar de Inquérito da Câmara dos Deputados que ficou conhecido como a “CPI da Grilagem” mostrou a enorme deficiência do sistema registral brasileiro.  Como exemplo desta desordem é frequente ser citado o caso de Babaçulândia no Tocantins, onde a área registrada dos imóveis é o dobro da área do município.

             A lei 10.267/2001 veio com o objetivo de identificar todas as áreas devolutas federais e estaduais, ELIMINAR A GRILAGEM, impedir a sobreposição de áreas e identificar as propriedades de forma inequívoca. Para isso, a nova legislação tornou o georreferenciamento obrigatório para a efetivação do registro imobiliário, em qualquer situação de transferência de imóvel rural nos prazos fixados:

  • 20/02/2004 para imóveis com área igual ou superior a 1000 hectares;
  • 20/11/2008 para imóveis entre 500 até 1000 hectares;
  • 20/11/2011 para todos os demais imóveis.
ATENÇÃO: O decreto 7.620/2011, publicado (22, novembro de 2011) no Diário Oficial da União, estende para 2023, a depender do tamanho da área, a realização do procedimento, exigido pela Lei 10.267/2011.
            TODOS OS IMÓVEIS RURAIS CUJA DESCRIÇÃO NO REGISTRO NÃO ESTIVER CERTIFICADA PELO INCRA APÓS OS PRAZOS ESTIPULADOS, TERÃO SUAS MATRÍCULAS AUTOMATICAMENTE BLOQUEADAS, somente voltando a circular juridicamente após o integral cumprimento da legislação do georreferenciamento. A nova lei determina aos cartórios de registro que se crie uma NOVA MATRÍCULA PARA OS IMÓVEIS GEORREFERENCIADOS. Este fato criou uma “EXCEÇÃO LEGAL” QUE TORNOU A RETIFICAÇÃO DO REGISTRO MUITO MAIS SIMPLES.  A RETIFICAÇÃO DE ÁREA que antes da nova lei dependia de uma enorme demanda judicial, passou as mãos do Oficial de Registro que pode agora, após analisar cada caso, proceder à retificação de forma muito mais rápida e não menos segura.  “Não existe limite de diferença de área, entre a descrição do registro antigo e o levantamento atual, para decidir pelo deferimento ou não da retificação. O que existe é a obrigatoriedade de a divergência não representar acréscimo ou diminuição indevida de área, mas tão somente erro constante do registro”.


             O GEORREFERNCIAMENTO COMO INSTRUMENTO DE CADASTRO

            O papel do cadastro imobiliário é proporcionar uma descrição clara e precisa do imóvel, para isso a nova legislação criou o CNIR – CADASTRO NACIONAL DE IMÓVEIS RURAIS, que será gerenciado conjuntamente pelo INCRA e pela Secretaria da Receita Federal.  Agora a identificação dos Imóveis Rurais se dará através de um CÓDIGO ÚNICO e dos dados constantes do CCIR – Certificado de Cadastro do Imóvel Rural.
            A legislação obriga os proprietários a atualizarem a DECLARAÇÃO PARA CADASTRO DE IMÓVEIS RURAIS (DP-INCRA), sempre que houver alteração em relação à titularidade (compra, venda, partilha etc.) e à proteção dos recursos naturais (Reserva Legal, Preservação Permanente, etc.). Nestes casos, a EMISSÃO DO CERTIFICADO DE CADASTRO DE IMÓVEL RURAL - CCIR pelo INCRA fica na dependência da ATUALIZAÇÃO CADASTRAL.

            Como, sem o CCIR, não é possível desmembrar, hipotecar, arrendar, vender, prometer em venda nem homologar, nenhuma partilha, amigável ou judicial, de imóveis rurais, os proprietários, de forma apressada providenciam esta atualização cadastral de seus imóveis. Muitos nem sabem que é a partir desta atualização cadastral que o INCRA avaliará, quanto da área aproveitável é efetivamente utilizada, e se atinge os índices de lotação para pecuária ou o rendimento para culturas vegetais considerados adequados, DETERMINANDO SE O IMÓVEL É OU NÃO PRODUTIVO.

 
            O GEORREFERENCIAMENTO E AS DESAPROPRIAÇÕES.

            Diante da pressão internacional para que o país organize a sua questão fundiária e da pressão interna exercida pelos movimentos sociais em favor da Reforma Agrária, o Governo tem intensificado os mecanismos legais para realizar desapropriações. Compreendido em seu sentido amplo, que é o do CUMPRIMENTO INTEGRAL DA NOVA LEGISLAÇÃO AGRÁRIA, o georreferenciamento pretende subsidiar o INCRA com informações que permitirão CLASSIFICAR OS IMÓVEIS E OS PROPRIETÁRIOS em função do conjunto de seus imóveis, VISANDO GERAR UM ESTOQUE DE TERRAS PASSÍVEL DE DESAPROPRIAÇÃO para fins de Reforma Agrária.
            “A moderna doutrina prega não ser mais a propriedade um direito absoluto, esse aspecto absoluto da propriedade é a sua função social. Se o proprietário não cumpre e não realiza a função social da propriedade, desaparece o direito de propriedade”. A seleção das propriedades a serem vistoriadas normalmente ocorre por indicação dos movimentos dos sem-terra e pela Federação de Trabalhadores Rurais da Agricultura, mas também pode ser desencadeada por motivo de fiscalização cadastral pelo INCRA.

            Quando um imóvel é selecionado para fiscalização cadastral pelas Superintendências Regionais, o INCRA suspende a emissão do CCIR - Certificado de Cadastro de Imóveis Rurais. É o que se chama de “inibição por fiscalização”. Outras razões também podem ocasionar essa suspensão. “CONVÉM ANTECIPAR-SE A UMA EVENTUAL FISCALIZAÇÃO E VERIFICAR SE SUA PROPRIEDADE ATINGE OS ÍNDICES DE PRODUTIVIDADE E ESTA CUMPRINDO A FUNÇÃO SOCIAL”. (CNA – Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil).

            Ser classificada como produtiva é condição essencial para afastar a propriedade dos efeitos da desapropriação para fins de reforma agrária. Mas é preciso atentar para as outras exigências no cumprimento da função social:
a) Utilização adequada dos recursos naturais e preservação do meio ambiente (respeitar a legislação ambiental).
b) Observância das disposições que regulam as relações de trabalho (respeitar a legislação trabalhista).
c) Exploração que favoreça o bem estar dos proprietários e trabalhadores (fornecimento de água potável, alojamento conveniente e instalações sanitárias, fornecimento gratuito de instrumentos de trabalho, etc.).

            Se o imóvel é produtivo e respeita a legislação ambiental e trabalhista, teoricamente esta afastada a possibilidade de desapropriação para fins de Reforma Agrária. Mas MUITOS IMÓVEIS, EMBORA PRODUTÍVOS, NÃO ESTÃO MUNIDOS DE PROVAS DOCUMENTAIS DESTA PRODUTIVIDADE, O QUE RESULTA NO MESMO QUE SEREM IMPRODUTIVOS. É fundamental poder comprovar, até porque o INCRA passou a exigir DOCUMENTAÇÃO COMPROBATÓRIA para muitos dos dados declarados ao cadastro; por exemplo:
1. Laudo Técnico (com Mapa de Uso da Terra), para comprovar áreas inaproveitáveis, áreas de Preservação Permanente e áreas inseridas em Mata Atlântica;
2. Anotação de Responsabilidade Técnica - ART para comprovar áreas sob processo técnico de formação ou recuperação de pastagens ou culturas vegetais.

            Imóveis que contenham estes tipos de “ÁREAS COM RESTRIÇÃO DE USO OU PRODUÇÃO”, devidamente declaradas e comprovadas, evitam que sobre as mesmas incida a exigência de produtividade, FATO QUE PODE IMPEDIR A DESAPROPRIAÇÃO. Outro caso comum é quando o imóvel é cedido em arrendamento, parceria, ou sob aluguel de pastagens. Recomenda-se que os contratos agrários sejam escritos em conformidade com a legislação e registrados no Cartório de Títulos e Documentos.

               A Lei só admite rendimento por hectare inferior aos índices exigidos (improdutividade), nos casos comprovados de “caso fortuito” (ocorrência de intempéries) ou de “força maior” (evento humano imprevisível), bem como nas ÁREAS DE PASTAGEM EM RECUPERAÇÃO TECNICAMENTE CONDUZIDA, desde que tais ocorrências sejam COMPROVADAS PELO INCRA. Outra situação em que o imóvel pode não atingir os índices exigidos e não ser passível de desapropriação é quando OBJETO DE IMPLANTAÇÃO DE PROJETO TÉCNICO aprovado pelo órgão federal competente ou elaborado por profissional legalmente habilitado e identificado, com Anotação de Responsabilidade Técnica – ART. A Comissão Nacional de Assuntos Fundiários da Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil – CNA sugere ainda, como medidas preventivas: AVERBAR A RESERVA LEGAL, PROVIDENCIAR O ADA (ATO DECLARATÓRIO AMBIENTAL), e cercar as áreas de reserva e de preservação permanente quando possível. Não basta existir a área de RESERVA LEGAL, ela deve estar AVERBADA À MARGEM DA MATRÍCULA DO IMÓVEL. Para tanto há que se fazer um PROJETO PROPOSTA DE LOCALIZAÇÃO da área, que deverá ser APROVADO PELA SECRETARIA DE MEIO AMBIENTE E RECURSOS HÍDRICOS – SEMARH.

TODAS ESTAS MEDIDAS SÓ TERÃO EFEITO SE TOMADAS COM ANTECEDÊNCIA. A Lei 8.629/1993 que regulamenta a Constituição Federal quanto a Reforma Agrária diz em seu Art. 9° que não será considerada qualquer modificação quanto ao domínio, à dimensão, e às condições de uso do imóvel, introduzida ou ocorrida após a data da comunicação para levantamento de dados e informações. E no Art. 7°, diz que não será passível de desapropriação para fins de reforma agrária, o imóvel que comprovar estar sendo objeto de implantação de projeto técnico que haja sido aprovado no mínimo seis meses antes da comunicação. Portanto vale lembrar o ALERTA AO PRODUTOR feito pela FAEB – FEDERAÇÃO DA AGRICULTURA E PECUÁRIA DO ESTADO DA BAHIA: “NÃO BASTA A TERRA SER PRODUTIVA, ELA PRECISA ESTAR LEGAL”.

José Caetano Ricci de Araújo
Engenheiro Agrônomo e Produtor Rural
Outubro de 2006

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