Por Letras
AmbientaiFonte: http://www.letrasambientais.com.br/posts/5-perigos-da-desertificacao-no-semiarido-brasileiro
Dona Marilene é uma agricultura que vive nos Cariris paraibanos, uma das
microrregiões mais secas do Brasil, cujas terras já se encontram em avançado
processo de desertificação. Junto com seu esposo Manoel e seus dois filhos, ela
já viveu dias felizes e de fartura naquele lugar. Porém, nos últimos cinco
anos, a família amargou as consequências de uma devastadora seca. As
dificuldades para conseguir água a longas distâncias, a carestia no preço dos
alimentos, a falta de chuvas e de terras férteis para produzir e criar animais
fez com que seu Manoel partisse para São Paulo. Em busca de alguma fonte de
renda para garantir o sustento da família, lá não demorou a encontrar uma ocupação
de ajudante de pedreiro. Este ano, com a volta das chuvas aos Cariris, ele já
se prepara para regressar à sua terra, trazer de volta a alegria da família
reunida e retomar suas plantações, embora saiba que seu pedaço de terra já não
é tão produtivo como antigamente.
Terra improdutiva, falta de
água, de animais e de vegetação. Essa realidade é comum às áreas que se
encontram em processo de desertificação. É o caso do local onde vive a família
de dona Marilene, situado no Semiárido brasileiro. Com mais de um milhão de
quilômetros quadrados de extensão, a região é considerada uma das maiores áreas
do mundo suscetível ao processo. A desertificação é provocada pela
degradação das terras nas zonas áridas, semiáridas e subúmidas secas, em função
de fatores naturais e também pela ação humana (desmatamento e uso intensivo da
terra para cultivo e pastagens sem técnicas de conservação adequadas).
No último dia 15 de abril, foi celebrado no Brasil o Dia Nacional da
Conservação do Solo. Porém, temos poucos motivos para comemorar, sobretudo por
estamos diante de um alerta relacionado às sérias ameaças do processo de
desertificação.
Segundo um Relatório
da Food and Agriculture Organization of the United Nations (FAO, sigla do inglês), publicado em 2016, atualmente,
33% dos solos do mundo estão comprometidos pela degradação, atingindo a vida de
mais de 2,5 milhões de pessoas. Além disso, em algum nível, a
desertificação afeta a economia e a população de um sexto da população do
Planeta, que representa mais de 1 bilhão de pessoas.
Os especialistas também chamaram atenção para a situação da América
Latina, onde cerca de 50% dos solos estão sofrendo algum tipo de degradação
(erosão, salinização, compactação, acidificação e contaminação). No Brasil, os
principais problemas encontrados são erosão, perda de carbono orgânico e
desequilíbrio de nutrientes, além de salinização, poluição e acidificação.
Entre outros prejuízos, como perda de fertilidade, os solos degradados captam
menos carbono da atmosfera, interferindo nas mudanças climáticas. A degradação
dos solos, de forma intensiva, tem levado ao avanço da desertificação, um grave
risco socioambiental, cujo processo é difícil de se reverter, sendo fundamental
combater diretamente suas causas.
Desertificação: um processo
irreversível?
Você sabe como uma área se torna gravemente deteriorada ou em processo
de desertificação? Tudo começa pelo desmatamento ou a retirada da cobertura vegetal, que
expõe os solos às diversas intempéries da natureza, a exemplo da forte
insolação ou das chuvas concentradas, aumentando a erosão do solo e a perda da
matéria orgânica que alimenta as plantas. O desmatamento descontrolado
também reduz as chuvas e a retenção da umidade, contribuindo para transformar
áreas produtivas em inférteis. Como consequência, muitas espécies nativas
são perdidas e ainda acontece a migração da população rural para centros urbanos.
Os principais vetores do processo de desertificação no Semiárido
brasileiro são: extração da biomassa florestal para atender à demanda da matriz
energética, que responde por 30% da energia regional; atividades de mineração,
cerâmica, agricultura e pecuária sem critérios de manejo sustentável, na
maioria das vezes, desenvolvidas com técnicas inadequadas; e projetos de
irrigação sem manejo adequado, que degradam e salinizam os solos.
No Brasil, as Áreas Susceptíveis à Desertificação (ASD’s) compreendem
cerca de 1.340.863 Km2 (16% do território
brasileiro), abrangendo 1.488 municípios (27% do total), incluindo territórios dos
nove estados do Nordeste, e de dois do Sudeste (parte de Minas Gerais e do
Espírito Santo). Mais de 30 milhões de pessoas (17% da população brasileira)
são atingidas pelo processo. O processo ocorre nas áreas Semiáridas, Subúmidas
Secas e em Áreas do Entorno, nas quais a razão entre a precipitação anual e
evapotranspiração potencial está compreendida entre 0,05 e 0,65.
As áreas mais críticas estão nos Núcleos de Desertificação, cujos solos
já estão degradados de forma extremamente grave, um processo de desertificação
praticamente irreversível.
São eles: Gilbués (PI), Seridó (RN/PB), Irauçuba
(CE), Cabrobó (PE), Cariris Velhos (PB) e Sertão do São Francisco (BA). Em
visita à dona Marilene, que vive nos Cariris paraibanos, um dos Núcleos de
Desertificação no Semiárido.
Fonte: Lápis.
|
Desertificação do Semiárido, pudemos observar a complexidade do problema, que atinge
milhares de outras famílias na região. No livro
“Um século de secas: por que as políticas hídricas não
transformaram o Semiárido brasileiro?”, os
autores abordaram o problema da desertificação no Semiárido brasileiro, tendo
validado a pesquisa sobre políticas para a seca nas microrregiões dos Cariris
paraibanos.
Desertificação: monitoramento e
políticas
Apesar da importância e urgência de ações para minimizar os impactos da
seca, bem como conter os principais vetores da desertificação, existe uma
lacuna muito grande de conhecimentos e dados confiáveis a respeito do assunto. Uma das principais
fontes de referência encontradas foram os dados de monitoramento por satélite
sistematizados pelo Laboratório
de Análise e Processamento de Imagens de Satélites (Lapis). O levantamento indica que os níveis de degradação em
relação às áreas totais dos estados do Semiárido estão distribuídos da seguinte
forma: Alagoas (32,8%), Paraíba (27,7%), Rio Grande do Norte (27,6%),
Pernambuco (20,8%), Bahia (16,3%), Sergipe (14,8%), Ceará (5,3%), Minas Gerais
(2,0%) e Piauí (1,8%).
Ainda não existe um projeto consistente de combate à desertificação no
Brasil, não obstante a gravidade do problema. Em 2004, foi elaborado o Plano de Ação
Nacional de Combate à Desertificação e Mitigação dos Efeitos da Seca
(Pan-Brasil), com envolvimento da população atingida e dos estados, visando
definir soluções para prevenir e amenizar os impactos do processo. Além disso,
o País é signatário da Convenção
das Nações Unidas de Combate à Desertificação (UNCCD). Todavia, embora a maioria dos estados com territórios
degradados tenha elaborado seu plano de ação, pouco foi feito efetivamente para
conter o avanço do processo.
Recentemente, foi instituída uma Política Nacional de Combate à
Desertificação e Mitigação dos Efeitos da Seca (Lei nº 13.153/2015), prevendo
várias providências relacionadas à questão.
Dentre os objetivos da recente
legislação, estão: prevenir e combater a desertificação e recuperar as áreas em
processo de degradação da terra, em todo o território nacional; prevenir,
adaptar e mitigar os efeitos da seca; instituir mecanismos de proteção,
preservação, conservação e recuperação dos recursos naturais; estimular
pesquisas científicas e tecnológicas; promover a educação socioambiental dos
atores sociais envolvidos na temática do combate à desertificação.
A instituição dessa Política representou um avanço nas diretrizes para
tratar do problema da desertificação e da convivência com a seca no Brasil. No
entanto, a legislação continua sem regulamentação, de modo que pouco tem
sido feito para se evitar o aumento da degradação dos solos nas áreas
suscetíveis à desertificação. Os projetos de desenvolvimento sustentável
para o Semiárido brasileiro deveriam