12 de jun. de 2011

O SERTÃO VAI VIRAR DESERTO?

           O crescimento populacional exigiu ao longo da história, a intensificação da produção agrícola, o que aconteceu pelo progressivo encurtamento no intervalo de abandono das áreas de plantio entre os períodos de cultivo. Na aurora da agricultura este intervalo ou pousio podia durar décadas, e proporcionava o “repousonecessário para a completa regeneração do solo. Um pousio reduzido significava maior produção por área, mas também progressiva degradação, tanto que alguns pesquisadores atribuem o desaparecimento de muitos povos à exaustão de suas terras. Assim teria acontecido com a Civilização Maia, com a Grécia antiga e com o Império Romano. Também os desertos da China, Pérsia, Mesopotâmia e o próprio Saara, seriam seqüela da devastação dos solos agrícolas. Outros pesquisadores, no entanto, entendem que não se deve exagerar o papel da influência humana. Com base em imagens de satélite que mostram o recuo do deserto em determinadas regiões do globo, afirmam que a natureza é muito mais poderosa e prevalece sobre as interferências da sociedade, que por sua vez, produziria apenas resultados regionais e aleatórios.

 
Desertificação é umconjunto de fenômenos que conduz determinadas áreas a se transformarem em desertos ou a eles se assemelharem” (Conti, J. 2009). Admite-se como certo que esteja relacionada a causas naturais (mudanças climáticas) e antrópicas (provocadas pelo homem). Quando resulta da ação humana a área atingida é chamada de “deserto ecológico”, o que acontece quando terras frágeis são usadas além de sua capacidade produtiva. Neste caso, as causas mais comuns são: cultivos excessivos (agricultura sem técnicas de conservação), e superpastejo (pecuária acima da capacidade de suporte) que, reduzindo progressivamente a matéria orgânica e a capacidade de armazenar água do solo, iniciam uma reação em cadeia, com mineralização, erosão, invasão de areias e degradação generalizada do ambiente.
A desertificação não acontece apenas em regiões semi-áridas; estas, entretanto são, naturalmente mais propensas. Para Vasconcelos Sobrinho, “o equilíbrio ecológico instável que se observa nos espaços semi-áridos brasileiros torna-os suscetíveis à desertificação [...] um deserto atípico, diferenciado do típico deserto saariano, mas com as mesmas implicações de inabitabilidade”. Considerado uma das maiores autoridades em ecologia na América Latina, este pesquisador pernambucano alertava: “Surgida uma seca prolongada, ou operada uma intervenção inamistosa do homem, principalmente através de queimadas sucessivas, desmantela-se a estrutura ecológica precária e implanta-se o deserto”. A partir de seus estudos a SUDENE identificou quatroNúcleos de Desertificaçãoem: Gilbués (PI), Irauçuba (CE), Seridó (PB) e Cabrobó (PE).
O Ministério do Meio Ambiente avalia que o Nordeste brasileiro tem uma mancha quase do tamanho do estado de Sergipe afetada, em diversos graus, pela desertificação, e considera uma superfície dez vezes maior comosuscetível”. Na Bahia, embora não haja nenhumNúcleo de Desertificação” na intensidade dos acima citados, existem áreas com evidências de progressiva aridização, como: a margem esquerda do Lago de Sobradinho, nos municípios de Remanso, Casa Nova, Pilão Arcado e Barra; o Raso da Catarina; o oeste baiano ao longo de afluentes do rio São Francisco; áreas de restinga do litoral norte e áreas do nordeste do estado. Entretanto, a degradação verificada nestas áreas é considerada reversível. Assim como a ação humana provoca a “desertificação ecológica”, pode fazê-la retroceder  com reflorestamentos ou com sistemas agroflorestais e silvipastoris (culturas, árvores, pastagem e animais  numa mesma área), capazes de prolongar o equilíbrio cíclico de: chuvas – armazenamento de água no solotranspiração vegetal - chuvas.

Enquanto a possibilidade de reverter o processo de “desertificação ecológica” permite otimismos, propaga-se uma concepção desfavorável  em relação à “desertificação por causas naturais”, desde que a tese do “aquecimento global” tornou-se majoritária no meio científico. Consideram os climatologistas que emissão de gazes estufa, mudanças climáticas e degradação dos ambientes naturais, são fenômenos  interdependentes. Desta forma, o calor em excesso gerado por áreas degradadas ou desertificadas, contribuiria para o aquecimento global, que por sua vez contribuiria para a desertificação, provocando mais aquecimento e assim por diante. O IPCC (painel criado pela Organização Meteorológica Mundial e pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente) afirma em um de seus relatórios que: “Se nada for feito em termos de mitigação e adaptação”, as regiões secas do planeta serão as mais fortemente afetadas pelas “mudanças do clima”. No Brasil, pesquisas de vários institutos (CPTEC / INPE / USP / IAG / FBDS / EMBRAPA / UNICAMP) confirmam a mesma expectativa e afirmam: “Se nada for feito para atenuar os efeitos do aquecimento global, [...] as secas serão mais intensas e freqüentes [...] com conseqüências sociais dramáticas [...] o clima semiárido poderá tornar-se árido e a caatinga [...] substituída por um tipo de semideserto com vegetação de cactáceas”.

O que é apenas uma probabilidade estatística para os climatologistas, desenha para o sertanejo um cenário inquietador. Vivendo uma realidade tão severa, é agora afligido pela possibilidade de um semiárido ainda mais seco.
- O sertão vai virar deserto?
A pergunta acende debates que estão longe de uma conclusão. Enquanto seguem as pesquisas, temos um caminho a seguir: o da precaução. Devemos contribuir para atenuar o “provávelaquecimento, e, felizmente, muito podemos fazer neste sentido. Um recente trabalho coordenado pela FAO destaca o grande potencial inexplorado de seqüestro e armazenamento de carbono nos solos sob pastagens dos sistemas pastoris e agropastoris das regiões secas. Devemos também, buscar a sustentabilidade e a preservação dos ambientes naturais, antes pela incontestável necessidade de preservar as riquezas naturais para as próximas gerações, independentemente de que a tese do “aquecimento global” se confirme ou não. Quanto ao estado de espírito a adotar frente à incerteza do clima futuro, lembremos o que diz um ilustre criador de cabras do Cariri paraibano:
“O otimista é um tolo. O pessimista, um chato. Bom mesmo é ser um realista esperançoso (Ariano Suassuna).
José Caetano Ricci de Araújo
Eng° Agrônomo e Produtor Rural
Ipirá – Bahia
Artigo publicadono jornal A Tarde em 28/08/2010.

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