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"Seu Manelito" e Cezar Mastrolorenzo - Faz. Carnaúba - 2010 |
Muitas pessoas me perguntam se em vez de ficar lutando contra a seca no semi-árido não era melhor eu vender tudo e comprar uma propriedade em um local de clima mais úmido. Não entendem o porquê da minha birra em lutar contra as adversidades no sertão já que facilmente eu poderia adquirir uma terra em um local com índices pluviométricos mais favoráveis.
Respondo sempre com uma velha desculpa que a propriedade foi de meu pai, e que por motivos familiares eu dou continuidade ao trabalho dele e outras justificativas melosas e cheias de valores familiares. Na verdade com meu pai já falecido, poderia me desfazer da propriedade e adquirir algo mais fácil de administrar, que ao menos não sofresse das adversidades climáticas do semi-árido.
Qual a mágica que a caatinga exerce sobre os sertanejos? De onde sai à conhecida “fibra sertaneja”? A mesma fibra que combateu sozinha metade do exército nacional, lembrando Canudos. A força que faz o caatingueiro enfrentar seca após seca, anos de privações, muitas vezes passando fome. De onde o homem do sertão tira a chama de esperança que move os seus pés calejados através das veredas e caminhos repletos da vegetação seca espinhosa e retorcida?
A caatinga, vegetação predominante do semi-árido, parece possuir alma própria, ou seja, quando chega o período das secas, ela se despe, prepara-se para o pior. Livra-se das folhas para preservar ao máximo a própria existência. Quando chega o período das águas de dezembro a março, ela se veste em flor, e no mais lindo espetáculo se torna bonita e perfumada. Tudo é festa. Os passarinhos vão e vem em revoada, os preás correm de toca em toca, procissões de catitus, pequeno porco selvagem, circulam entre os umbuzeiros lambuzando-se de frutos maduros que caem do pé. As Seriemas em grupo fazem coro em baixo dos juazeiros. Jacus do tamanho de galinhas banham-se nos poços de água retidas nos lajedos. Os riachos cantam zoando ao bater nas pedras. A água se perde morro abaixo. O verde dói aos olhos, quando vem o sol ele brilha mais forte transformando o verde em um reluzente verde-prateado. É a fartura. De abril a julho tão logo as chuvas se vão o sertanejo armazena o fruto de sua produção, a farinha o feijão e o milho. No chiqueiro na ceva quatro ou cinco leitões esperam a lavagem, pretos não só pela cor dos pelos, mas também pela cor da lama que se espojam. No campo a burregada corre solta, na larga a vacada gorda rumina na sombra de uma velha umburana. Passam-se os meses e os leitões viram mantas de carne seca, conservou-se uma porca para o ano seguinte dar cria, dos cabritos, os que escaparam dos ataques da suçuarana e da jibóia, foram vendidos na feira e feitos em rapadura, sal, café, e pólvora. Na apartação dos bezerros, o mais bonito da cara preta vai ficar para marruá. Os outros vão pastar na manga do cajueiro.