Por João Ambrósio de Araújo Filho
A vegetação lenhosa da caatinga, em sua maioria formada
por espécies caducifólias no período seco, adiciona ao solo cerca de quatro
toneladas de matéria seca de folhas e galhos, contribuindo, assim, com um papel
fundamental na reciclagem de nutrientes. Além disso, cerca de 70% das espécies
lenhosas de alguns sítios ecológicos participam da dieta de bovinos, caprinos e
ovinos. A manipulação dessas espécies, seja para a melhoria da qualidade e para
o aumento da produção de forragem, seja para uso de sua fitomassa foliar como
adubo orgânico, requer um conhecimento adequado das características da produção
e da composição química de sua fitomassa. Como esses fatores se relacionam com
o ciclo fenológico das plantas, servem também como base para determinação da
melhor época de sua utilização. As espécies lenhosas da caatinga apresentam diferenças
estacionais em seus ciclos fenológicos, possivelmente associadas a flutuações
da composição química de sua folhagem. Vale salientar que a riqueza florística
forrageira da caatinga é pouco conhecida, dificultando a seleção de espécies
com potencial para utilização em sistemas agroflorestais ou como forrageiras.
Essa deficiência de conhecimento contribui para a prevalência de um manejo da
vegetação puramente extrativista, carecendo de práticas e tecnologias adequadas
ao aporte de uma base de sustentabilidade à atividade pastoril e agroflorestal
nos ecossistemas da caatinga. As características anatômicas, morfológicas e
fisiológicas estão associadas aos mecanismos de adaptação das espécies lenhosas
às condições de seca das regiões semiáridas. Porém, em se tratando de árvores e
arbustos, dois mecanismos se destacam: a resistência e a tolerância. As
espécies lenhosas com mecanismo de resistência à seca são perenifólias e
apresentam folhas pequenas ou folíolos, céreos ou rugosos, superfície foliar
ondulada, com os estômatos localizados na parte côncava, espinhos ou acúleos,
caules com vasos lenhosos curtos e de pequeno diâmetro, com paredes espessas,
sistema radicular profundo e extenso. Nas regiões semiáridas tropicais essas
espécies botânicas são predominantemente do tipo C3 ou crassuláceas. Por outro
lado, as árvores e os arbustos, com mecanismo de tolerância, são caducifólios e
possuem geralmente folhas grandes, tenras e lisas, podendo ter espinhos, caules
com vasos lenhosos longos de grande diâmetro, sistema radicular lateral extenso
e, nos trópicos semiáridos, são espécies botânicas geralmente do tipo C4. A
combinação variável dos fatores supracitados resulta em diversidade de
situações que caracterizam os diferentes graus de adaptação das espécies
arbóreas e arbustivas da caatinga às condições do Semiárido nordestino. O
mecanismo de tolerância apresenta-se como o mais comum entre as espécies
lenhosas da caatinga, possivelmente por permitir uma melhor adaptação às
características da variabilidade das precipitações pluviais da região. Algumas
das espécies botânicas, de maior interesse serão descritas a seguir.
Aroeira (Myracrodruon
Urundeuva)
Da família das Anacardiáceas, a aroeira (Figura 15) é uma
árvore típica dos estágios finais da sucessão secundária da caatinga,
encontrada nos sertões nordestinos de baixa a elevada altitude, na maioria dos
solos da região, com predominância nos luvissolos crômicos órticos, latossolos
e argissolos. Árvore que pode alcançar até 25 m de altura, de crescimento
moderado, sistema radicular com raiz pivotante pouco pronunciada, caule inerme,
lenho pesado, com densidade específica de 900 kg/m3. Caducifólia precoce, copa
arredondada moderadamente densa e folhas compostas. Seu ciclo fenológico se
verifica ao longo de todo o ano. Durante a época das chuvas, a planta inicia
com a rebrotação, permanecendo em vegetação plena até o fim do período, quando
perde sua folhagem. Ao meio da época seca entra em floração e frutificação,
totalmente desprovida de folhas, completando, então, seu ciclo fenológico.
Planta útil como forrageira, produtora de madeira para construção e lenha,
medicinal e utilizada na coleta apícola de pólen e néctar. Análises laboratoriais da folhagem da aroeira, colhida
nas fases de vegetação plena e dormência (Tabela 2), indicaram que o teor médio
de matéria seca é de 38,5%, na fase de vegetação plena, alcançando, na
dormência ou restolho, cerca de 89,6%. O teor de proteína bruta decresceu de
16,7%, na fase de vegetação plena, para 8,7%, na dormência. A fibra em
detergente neutro e a fibra em detergente ácido apresentaram valores sempre
baixos, flutuando a primeira de 20,5 a 36,5% e a segunda de 11,1 a 21,7%,
respectivamente, para as fases de vegetação plena e de dormência. O teor de
lignina alcançou 4,5%, na vegetação plena, aumentando para 6,7%, na dormência,
um dos menores entre as espécies arbóreas da caatinga. Por outro lado, o
percentual de taninos totais foi sempre o mais elevado, variando de 35,8, na
fase de vegetação plena, a 10,5, no restolho lenhoso. Por fim, a
digestibilidade in vitro da matéria
seca (DIVMS) pode ser considerada elevada para uma arbórea nativa, variando de
65,6% na fase de vegetação plena para 30,5% na dormência.
As folhas da aroeira são consumidas, verdes ou secas, por
bovinos, caprinos e ovinos. É uma arbórea que não deve ser rebaixada, mas
devido a sua utilidade como produtora de madeira e de produtos medicinais, é
preferível preservá-la. Seu aproveitamento pela pecuária deverá ser pelo uso de
suas folhas naturalmente fenadas. Sua contribuição para a circulação de
nutrientes em um sistema agroflorestal é muito importante, considerando-se o
elevado teor de nitrogênio em suas folhas e a rapidez com que se degradam, após
sua queda ao solo.
Catingueira
(Poincianera pyramidalis)
Da família das Cesalpináceas, a catingueira (Figura 16) é
uma árvore típica dos estágios intermediários da sucessão secundária da
caatinga, encontrada nos sertões nordestinos de baixa a elevada altitude, na
maioria dos solos da região, com predominância nos luvissolos crômicos órticos
e argissolos. Árvore que pode alcançar até 10 m de altura, de crescimento
lento, sistema radicular com raiz pivotante pouco
pronunciada, caule inerme,
lenho pesado, com densidade específica de 920 kg/m3. Copa
arredondada moderadamente densa e folhas compostas. Caducifólia tardia, seu
ciclo fenológico se verifica durante a época das chuvas, com o início da
dormência em plena estação seca. Alcança a vegetação plena no começo da estação
das chuvas, flora ao meio da estação e frutifica ao final do período úmido.
Planta útil como forrageira e produtora de néctar e pólen e de lenha.
Análises laboratoriais da folhagem da catingueira, colhida
em diferentes fases de seu ciclo fenológico (Tabela 3), apontaram um teor de
matéria seca que se mantém sempre elevado, acima de 40%, alcançando, na fase de
dormência (restolho), cerca de 87,1%. O teor de proteína bruta, por seu turno,
decresceu de 16,9% na fase de vegetação plena para 14,4% na frutificação e para
11,2% na dormência. A fibra em detergente neutro e a fibra em detergente ácido
apresentaram valores sempre baixos, flutuando a primeira de 31,9 a 49,8% e a
segunda de 19,8 a 33,4%, respectivamente, para as fases de vegetação plena e de
dormência. O teor de lignina alcançou 6,6% na vegetação plena, aumentando para
12,7% na frutificação e decaindo para 11,7% na dormência, um dos menores entre
as espécies arbóreas da caatinga. Por outro lado, o percentual de taninos
totais foi sempre muito elevado, variando de 20,6 na fase de vegetação plena a
9,5 na dormência. Por fim, a
digestibilidade in vitro da matéria seca pode ser considerada elevada para uma
arbórea nativa, variando de 58,4%, na fase de vegetação plena, para 50,4%, na
frutificação, atingindo 30,9% na dormência. As folhas da catingueira têm
consumo insignificante quando verdes, devido, provavelmente, ao odor
desagradável que possuem. Porém, quando secas, são consumidas por ovinos,
caprinos e bovinos, participando em até 35% de suas dietas no período seco. A catingueira é uma arbórea que não deve ser rebaixada,
podendo, no