Por José Caetano Ricci de Araujo.
1) Precipitação pluviométrica anual inferior a 800 mm;
2) Índice de aridez menor que 0,5 (calculado pelo balanço hídrico que relaciona as precipitações e a evapotranspiração potencial, no período 1961-1990);
3) Risco de seca maior que 60% (com base no período 1970-1990).
Toda a dinâmica desta imensa região esta subordinada à adversidade do clima. Além do fenômeno da “seca”, é comum chover num mês quase toda a chuva esperada para o ano, ou ainda, chover bem em determinado local e algumas centenas de metros adiante não cair uma gota. A esta “desarrumação” pluviométrica soma-se o elevado potencial de evaporação e transpiração vegetal que, inviabiliza a maioria das lavouras, tornando impraticável a agricultura intensiva (exceção feita à pequena área irrigável). A atividade pecuária também é afetada pela má distribuição das chuvas. Como acontece em todo o Brasil, a pecuária baiana é fundamentalmente feita a pasto. Noventa por cento do total de animais abatidos são terminados a pasto e nas fases de cria e recria este percentual é de praticamente 100%. Inclusive a produção de leite é feita, predominantemente, a pasto, com tecnologias simples e custos monetários reduzidos. Portanto, embora o ambiente arejado e seco da região seja benéfico aos rebanhos, os longos períodos de déficit hídrico limitam a capacidade de produção forrageira comprometendo a principal vocação do semiárido baiano que é a pecuária.
A eficiência econômica dos sistemas de produção a pasto é alcançada com a maximização da produtividade primária (produção do pasto) e, paralelamente, da produção secundária (transformação do pasto em carne, leite...). Daí a necessidade de buscar:
a- forragens apropriadas ao tipo de solo e clima;
b-técnicas de manejo que propiciem maior produtividade ao pasto e
c-animais adaptados às condições biológicas e econômicas de produção (sistema de criação, tipo de alimentação, ambiente, etc.).
Assim como encontramos na Palma forrageira e nos capins Urochloa, Birdwood e Buffel Grass, alternativas para produzir forragem sob precipitação escassa, em solos rasos e pedregosos, precisamos encontrar animais adaptados ao clima quente e seco, eficientes na conversão do alimento e cuja demanda por nutrientes e energia seja possível atender com a limitada biomassa que nossos pastos conseguem produzir. Animais capazes de responder bem às condições de pastejo típicas do semiárido.
Embasados na lógica da sustentabilidade e no principio da harmonia entre o animal e seu ambiente, acreditamos que uma das melhores alternativas para a pecuária das regiões secas do nordeste brasileiro veio da província de Sindi no Paquistão. Uma região semidesértica, com precipitação entre 250 e 300 mm/ano, temperaturas que oscilam entre 1,6° e 48°C e ventos frequentes de até 54 km/hora. Para compreender porque a raça autóctone de Sindi, com seus animais de pequeno ou médio porte, representa uma excelente alternativa para a pecuária do semiárido brasileiro, precisamos, antes, entender como os bovinos, de uma maneira geral, “funcionam” em condições de pastejo.
Os animais só atingem seu potencial de produção quando as exigências em proteína, energia, vitaminas e minerais são completamente atendidas. Em regime de pasto, estas exigências deverão ser supridas pelo consumo diário de forragem. O organismo animal determina uma ordem de prioridades para o uso do alimento. A “energia” do alimento é utilizada primeiro para mantença (manutenção do peso, respiração, circulação, trabalho muscular, etc.) e só depois para produção (crescimento, reprodução, engorda e lactação). Portanto, só haverá produção, quando o suprimento alimentar for superior às necessidades de mantença do animal.
Por sua vez, a “colheita” da forragem feita diretamente pelos animais (pastejo) é um “trabalho” e, como tal, consome energia. Quando é grande a disponibilidade de forragem por área e por animal, este pode comer à “boca cheia” e selecionar o que comer em termos de partes da planta e mesmo de espécies entre plantas. Já em pastagens muito baixas ou pouco densas o consumo de forragem fica limitado. Nestas condições, mesmo que o animal tenha uma grande área a sua disposição, é comum ele utilizar toda a “jornada de trabalho” (pastejo) sem conseguir colher forragem suficiente.
À medida que progride a estação seca os animais aumentam o tempo de pastejo e, mesmo assim, o consumo diário de forragem diminui, já que o aumento do tempo não consegue compensar a redução em densidade e qualidade do pasto. Podemos simplificar dizendo que o animal gasta cada vez mais energia, para comer cada vez menos, um pasto cada vez pior.
Nestas condições a suplementação com “misturas múltiplas” - “proteinados” pouco ou nada resolvem, já que, não são fatores nutricionais (digestibilidade, proteína bruta, teores de minerais, etc.) que estão limitando o consumo e o desempenho animal. É, na verdade, a “estrutura física” do pasto (massa, densidade, altura, relação haste/folha...) que esta limitando a ingestão de forragem. Os animais, simplesmente, não estão conseguindo ingerir energia suficiente para suas necessidades de mantença e produção.
A seleção natural (do ambiente) e dirigida (por criadores, pastores e melhoristas) realizada ao longo de muitas gerações conferiu á raça Sindi um genótipo perfeitamente ajustado às condições de pastejo de ambientes quentes e secos. Eficiente na conversão de forragem fibrosa e precoce, tanto na reprodução como no crescimento e terminação (acabamento de carcaça). O menor porte da raça é consequência de um processo natural de adaptação, que se verifica tanto em animais como vegetais de regiões semiáridas, necessário para que possam sobreviver e reproduzir apesar da escassez de água e alimentos. A própria caatinga nordestina com seus pequenos animais silvestres e vegetação característica é um exemplo deste processo de adaptação.
De fato, o menor porte do Sindi, aliado à sua perfeita adaptação ao clima, tornam mínimo seu dispêndio de energia para mantença, possibilitando que, mesmo em pastagens pobres, “sobre” energia para produção de leite, carne e bezerros. Não obstante, sua menor estatura, despertou e ainda desperta resistência de uma parcela considerável de criadores. Preconceito que vem sendo paulatinamente superado pelas qualidades da raça, constatadas por criadores, técnicos e instituições de pesquisa. A Embrapa Gado de Leite, por exemplo, exalta sua produtividade, considerando-a: “pelo melhor aproveitamento por área, menor consumo absoluto de alimentos, [...] eficiência reprodutiva [...] e excelente adaptabilidade às condições do semiárido, [...] uma excelente opção [...] para as regiões adversas de manejo do Nordeste brasileiro, [...] como raça pura e em cruzamento, [...] principalmente, para pequenas explorações leiteiras típicas da agricultura familiar”.
Também como produtor de carne o Sindi, “apesar” do porte reduzido, mostra eficiência. A habilidade para manter-se em boas condições corporais mesmo nos períodos de maior adversidade favorece a vida reprodutiva das vacas, permitindo excelente resposta em termos de bezerros desmamados/ano, um dos principais indicadores de eficiência econômica nos sistemas de produção da pecuária de corte. Outro indicador importante é a redução da idade ao primeiro acasalamento para dois anos ou menos. Esta possibilidade que a destacada precocidade do Sindi permite, “resulta em impactos econômicos mais significativos [...] do que a redução da idade de abate dos quatro para os dois anos de idade” (Pereira Neto et al. 1999).
No Brasil, o marketing que pretende vender a ideia do “animal ideal”, perfeito em todas as suas características econômicas, adaptado a qualquer região e eficiente, seja qual for o sistema de produção, esconde a existência de nichos biológicos e econômicos para as diversas raças. São as condições climáticas e de mercado das diferentes regiões, sob as quais o rebanho irá transformar pasto em produtos, que determinarão o tipo animal apropriado (espécie, raça, tamanho) e que, por sua vez, deverá ser avaliado dentro do conceito de produção por unidade de área (arroba/ha; bezerros/ha; leite/ha; etc.).
O ambiente natural e o cenário econômico do semiárido conduzem ao Sindi, com sua capacidade incomparável de atravessar longos períodos de escassez “economizando” energia, mantendo-se prolífica e alcançando elevada produtividade por hectare. Uma produtividade que é consequente à perfeita harmonia entre animal e ambiente, e não fruto de artificialismos antieconômicos e agressivos. Uma produtividade “coerente”, alcançada nas pastagens de criadores que “vivem” da pecuária e não nas cocheiras fartamente abastecidas dos que criam por hobby.
Convencidos do potencial desta raça, adquirimos em setembro de 2009 durante o XXV Leilão da EMEPA (Empresa de Pesquisa Agropecuária da Paraíba), nossos primeiros animais. Apesar de ter criadores em todo o nordeste, na ocasião fomos informados pelo presidente da ABCSindi, D. Paulo Miranda Leite, que até aquela data “a associação não havia identificado nenhum criador ou associado no estado da Bahia”. Assim nos tornamos os primeiros associados e representantes da ABCSindi em nosso estado. Com esta responsabilidade criamos a Bahia Red Sindhi, uma parceria entre criadores que pretende divulgar as qualidades produtivas e a perfeita adaptabilidade do Sindi paquistanês ao semiárido baiano.
Bahia Red Sindhi
José Caetano Ricci de Araujo
Faz. Brava – Ipirá/Ba
Cezar Augusto Ricci Mastrolorenzo
Faz. Tombador – Itatim/Ba
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