1 de abr. de 2017

OPÇÕES NO USO DE FORRAGEIRAS ARBUSTIVO-ARBÓREAS NA ALIMENTAÇÃO ANIMAL NO SEMI-ÁRIDO DO NORDESTE

Gherman Garcia L. de Araújo, Severino G. de Albuquerque, Clóvis Guimarães Filho - Pesquisadores da Embrapa Semi-Árido - Caixa Postal 23. 56300-970 - Petrolina, PE
INTRODUÇÃO 
A pecuária tem se constituído, ao longo tempo, em função das condições edafo-climáticas desfavoráveis, na atividade básica das populações rurais distribuídas nos 95 milhões de hectares da região semi-árida nordestina. As lavouras tem sido consideradas apenas como um sub-componente inexpressivo dos sistemas de produção predominantes, face a sua maior vulnerabilidade as limitações ambientais. O rebanho nordestino, embora expressivo (25,9 milhões de bovinos, 10,4 milhões de caprinos e 7,5 milhões de ovinos), segundo o
A acentuada redução anual na oferta de
 forragem,durante as estações secas,
 é o principal fator determinante 
do nível de produtividade.
IBGE (1991), apresenta níveis de produtividade bastante baixos. Guimarães Filho e Soares (1992) citam para bovinos sob sistema tradicional de caatinga, índices anuais de parição

em torno de 40%, taxas de mortalidade de bezerros acima de 15% e peso vivo médio ao abate de 340 kg, aos 4 -5 anos de idade. Para caprinos, os números são também indicadores de um pobre desempenho. Guimarães Filho (1983) cita intervalos entre partos superiores a 300 dias e taxas de mortalidade de crias de ca. 35% ao ano. Este baixo desempenho zootécnico se deve, principalmente, a forte dependência que os sistemas de produção tem da vegetação nativa da caatinga, fonte alimentar básica, quando não única, dos rebanhos. A acentuada redução anual na oferta de forragem, durante as estações secas, é o principal fator determinante do nível de produtividade. Alternativas convencionais de redução ou solução desses problemas, tem surtido resultados quase negligenciáveis, em função, também, de limitantes de ordem estrutural, tais como, tamanho e precárias condições de posse da terra, falta de organização dos produtores, descapitalização e acesso limitado ao credito, pouco acesso a assistência técnica e serviços de apoio, e cujo equacionamento é condição prévia para a obtenção de índices expressivos de adoção das inovações tecnológicas geradas. Mesquita et al. (1988) relatam que na estação chuvosa (período de crescimento), a vegetação da caatinga alcança seu máximo de produção. Entretanto, durante a estação seca (período de dormência), variando de 6 a 8 meses, as produções de fitomassa descem a valores muito baixos, e mesmo sem a presença dos animais, em áreas deferidas, a ação do intemperismo provoca perda que pode chegar até 60% da produção da área. É neste período que a participação das folhas secas que caem das árvores e ficam disponíveis para os animais, no solo, fornecem importante componente, tanto na proteção do solo quando ocorrem as primeiras chuvas, como também na alimentação dos
O uso planejado e diversificado de opções forrageiras,
nativas ou introduzidas, pode aumentar a chance de
 sucesso dos sistemas de produção pecuária.
animais, quando oriundas de plantas forrageiras. Esses aspectos reforçam o uso estratégico de alternativas alimentares, como forma de suplementação nutricional desses animais, objetivando melhorar os índices de produtividade e consequentemente a renda familiar dos produtores desse setor. Estudos efetuados pela Embrapa Semi-Árido demonstraram que o uso planejado e diversificado de opções forrageiras, nativas ou introduzidas, pode aumentar a chance de sucesso dos sistemas de produção pecuária. Neste trabalho, procura-se sintetizar as principais características do sistema Caatinga, Bufell e Leucena (CBL) e reunir informações disponibilizadas por diferentes instituições de pesquisa e ensino do Nordeste, sobre o uso de opções forrageiras arbustivas e arbóreas, nativas ou introduzidas, dentro de um contexto de "Sistemas Agroflorestais Pecuários". 
SISTEMA CAATINGA - BUFELL - LEUCENA (CBL) 
Estudos da Embrapa Semi-Árido identificaram, para a caatinga hiperxerófila do Sertão pernambucano do São Francisco, uma capacidade de suporte de 15 a 20 ha/UA/ano (Salviano et al., 1982), em função da variação pluviométrica entre anos. Embora Araújo Filho (1990) tenha demonstrado no Ceará, a possibilidade de se elevar a capacidade de suporte da caatinga de 10 - 12 para 2,5 - 4,5 ha/bovino/ano, pelo uso de técnicas de manipulação da caatinga (rebaixamento, raleamento, etc.), isto não pode ainda ser comprovado no tipo de caatinga arbustivo-arbórea densa predominante no Sertão pernambucano. Com estas técnicas, contudo, há perspectivas de se obter um aumento na produção de matéria seca/ha no período verde, em detrimento da oferta da forragem disponível durante o período seco. Com uma capacidade de suporte desta magnitude e uma estrutura fundiária onde mais de 90% são estabelecimentos com área inferior a 100 ha, a alternativa para os sistemas pecuários do Sertão pernambucano, seria procurar ganhos de produtividade no fator terra. Isto só seria possível com um manejo racional da caatinga, utilizando-a apenas naquele período de 2 a 4 meses ao ano, quando ela oferecesse a máxima oferta de forragem, em termos quantitativos e qualitativos. Para o
COMANDANTE BRS
restante do ano, o sistema produtivo seria complementado com pastos cultivados, e com gramíneas e leguminosas na forma de forragem conservada. Para as áreas onde é possível alguma agricultura, os restolhos dariam um complemento importante ao sistema. Para as áreas mais secas, uma reserva estratégica de palma forrageira (Opuntia ficus-indica Mill.) seria recomendável. Para aplicação de um sistema desse tipo, a Embrapa Semi-Árido, com base em estudo do Ministério da Agricultura (Brasil, 1979), identificou preliminarmente no Sertão de Pernambuco, que cobre uma área de 6,8 milhões de ha, áreas com potencial para o tipo de pecuária acima mencionado, as quais correspondem a 3,3 milhões de ha (49% da área). Para se melhorar o desempenho da pecuária da região, a Embrapa Semi-Árido, delineou um sistema de produção com base na caatinga, com a incorporação do capim buffel e de uma área destinada a produção de um volumoso com nível de proteína mais alto, cuja fonte é uma leguminosa, chamado por isso de sistema CBL, que pode ser a leucena (Leucaena leucocephala (Lam.) De Wit.), o guandu (Cajanus cajan (L.) Millsp.), a gliricídia (Gliricidia sepium (Jacq.) Walp.), ou até mesmo a maniçoba (Manihot pseudoglaziovii Pax & K. Hoffm.), que não é uma leguminosa, mas que, graças às pesquisas na Embrapa Semi-Árido, deixou de ser considerada uma planta tóxica, para aos poucos, se tornar uma
Gliricidia sepium
forrageira lenhosa muito importante. Estas forrageiras são submetidas a cortes na época das chuvas para produção de feno ou silagem. Entre outras forrageiras que devem e podem ser incorporadas ao CBL, a palma tem um grande relevância, por ser um volumoso, tido como energético e seguro nas secas prolongadas (Albuquerque, 1999b). No CBL, tanto o pastejo na caatinga quanto no capim buffel são estratégicos. Na estação chuvosa, bovinos e caprinos são mantidos na caatinga, enquanto que na época seca, os bovinos são removidos para o capim buffel, onde tem acesso à área de leguminosa, ou recebem feno dela no cocho. Enquanto isto, os caprinos são mantidos na caatinga o ano inteiro, onde na seca, dependendo da necessidade, também recebem suplementação volumosa (Albuquerque, 1999b). O ponto mais importante neste enfoque é que o pecuarista veja que tanto uma importante gramínea, quanto uma forrageira rica em proteína são incorporados ao sistema. Como pode ser visto nos Quadros 1 e 2, o desempenho bovino aumenta significativamente com a incorporação do capim buffel e da leucena. Com relação à caatinga, por tratar-se de um ecossistema frágil, apenas uma parte da vegetação nativa deve ser eliminada, e há o consenso entre os especialistas em caatinga, de que a parte a ser deixada deve ser entre 40 e 60 % da área total. Com isto, há uma certa variedade de produtos a serem retirados do sistema (Quadro 2) (Albuquerque, 1999b). 

Quadro 1 - Desenvolvimento de garrotes azebuados, sob sistemas de pastagens diferentes
1 "L" pode significar leucena, leguminosa, maniçoba, ou qualquer forragem com alto teor protéico, produzida na propriedade. Fonte: Adaptado de Albuquerque (1999b).
Quadro 2 - Produtos oriundos do Sistema Tradicional vs CBL (40% de pastagem cultivada).
Fontes: 1Araújo Filho (1985); 2Dado proveniente da produção de 305,7 kg/árvore/ano (Brito et al., 1996) multiplicado por 2,3 árvores/ha (Albuquerque, 1999a); 3Carvalho (1969); 4Adaptado de Guimarães Filho e Soares (1999); 5Deduzido de 60 % do sistema tradicional. 
O sistema concebido pela Embrapa, já se acha em processo de avaliação e, diversos trabalhos comprovaram a viabilidade das diferentes espécies para as condições do Sertão pernambucano, permitindo assim a concepção do CBL. Em experimento conduzido por três anos, Guimarães Filho e Soares (1997) observaram que garrotes suplementados com apenas 1,5 kg de feno de leucena/cab/dia, durante o período seco, estavam ao final do período experimental, 03 arrobas mais pesados que aqueles que também pastavam no capimbuffel no período seco, mas não tinham acesso ao feno. Comparados com garrotes submetidos ao sistema tradicional de caatinga, a diferença elevou-se a 05 arrobas. Um modelo físico do sistema CBL envolvendo cria-recria de bovinos foi implantado preliminarmente na Embrapa Semi-Árido, a partir de 1991, numa área de 87 ha, na qual 35,0 ha (40%) são ocupados por capim-buffel, 2,66 ha (30%) por leucena e os restantes 49,9 ha (57%) por caatinga bruta. Considerando o período dezembro/91 a novembro/92, a taxa de parição das vacas alcançou 76,2%, ou seja, quase duas vezes a taxa obtida nos sistemas tradicionais, o que é um indicativo bastante promissor das potencialidades do sistema. O Projeto Caatinga, elaborado pela Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco (CODEVASF) com base na pesquisa da Embrapa, estima que uma propriedade com 100 ha pode chegar a gerar uma receita líquida de até US$ 8 mil dólares/ano. No modelo tradicional, a estimativa é que esse valor seja inferior a US$ 1,000 dólares/ano. No Projeto Caatinga se prevê a instalação de sistemas do tipo CBL em 200 mil ha de propriedades familiares nos estados da Bahia, Pernambuco, Sergipe e Alagoas. É um investimento de US$ 77.8 milhões, que está sendo captado junto a uma instituição de fomento ligado ao Governo do Japão. 

FORRAGEIRAS ARBUSTIVO-ARBÓREAS NATIVAS 
A vegetação nativa dos

Pensamento do mês