16 de jul. de 2011

A CADEIA DA CARNE E A QUESTÃO AMBIENTAL

           A partir da segunda grande guerra, o processo mundial de globalização (integração, social, cultural, política, e econômica), fez surgir a questão da “uniformização internacional de normas e procedimentos” ou “padronização internacional” que pretende facilitar o livre comércio entre países. Neste contexto surgiu a série ISO.
A International Organization for Standardization - ISO, com sede em Genebra, Suíça é uma organização internacional, fundada em 1946, cujos membros são entidades normativas provenientes de 111 países como a ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas. Tornou-se popular a partir da série ISO 9000 (grupo de normas técnicas que estabelecem um modelo de gestão da qualidade para organizações em geral).
A preocupação mundial com as questões ambientais fez com que a ISO criasse uma série de normas especiais para tratar da questão ambiental. Para conquistar os certificados ISO 14000, a organização pleiteante, deverá, além de cumprir a legislação ambiental aplicável, ter implantado um Sistema de Gestão Ambiental; assumir um compromisso com a melhoria contínua de seu desempenho ambiental; submeter-se a auditorias ambientais; avaliar o ciclo de vida de seus produtos e atender a outras exigências que comprovem a adequação dos seus produtos aos novos paradigmas ambientais.
Mesmo sendo a ISO 14000, uma série de normas de “adoção voluntária”, em uma economia globalizada, uma vez adotada pelos países desenvolvidos, passa a ser inevitável para países que desejarem ter acesso a mercados externos. Passa a ser uma “exigência do mercado” o que nos faz lembrar a critica do professor Milton Santos ao processo de globalização: “Estaremos diante de um determinismo de tipo novo, um neodeterminismo do espaço artificial?”.

Os ensinamentos deste eminente geógrafo (um dos intelectuais mais importantes do Brasil) mostram a necessidade de considerar os diferentes níveis de desenvolvimento entre países que se veem “obrigados a voluntariamente” adotar tais normas. Países que ainda não alcançaram determinado grau de desenvolvimento e que, certamente, terão dificuldades de arcar com o custo adicional envolvido na conformidade com normas internacionais. Dependendo do país, a adoção da norma pode significar perda de competitividade internacional do produto. Outra questão que deve ser considerada é o conflito entre o comércio internacional e a proteção ambiental inerente aos tratados internacionais, por exemplo, a possibilidade de que as “normas ditadas pela liberação comercial sejam usadas para enfraquecer medidas ambientalistas por governos que não queiram pagar os custos de proteção ambiental.” (TAYLOR, 1993), ou ainda que a força do apelo ambiental, principalmente nos países desenvolvidos, sirva como “cortina de fumaça” para medidas protecionistas.
No Brasil, com indústrias caracterizadas, basicamente, pela “alta intensidade de recursos naturais, energia, escala e poluição” (VEIGA, 1994), especialmente naqueles setores com melhor desempenho exportador e em que a concorrência se dá via preço, os custos de adaptação a requisitos de ordem ambiental podem ser muito elevados.  Neste caso as imposições de padrões e normas ambientais externas que limitam o uso de recursos naturais e energia tornam nossa situação vulnerável.

Vejamos o caso da cadeia da carne. A competitividade da indústria de carne brasileira foi consequente, até passado recente, à vantagens de custos de produção, recursos naturais abundantes e poucas restrições ambientais.  A ocorrência de doenças em países tradicionalmente produtores e exportadores como BSE, dioxina e aviária abriram oportunidades para o Brasil. Esta conjunção de fatores levou-nos à condição de maior exportador mundial de carnes. Entretanto, a preservação desta posição dependerá agora da adequação às exigências cada vez maiores do mercado. Caminhamos em direção a um sistema de gestão ambiental para toda a cadeia produtiva em que: sanidade animal, segurança do alimento e práticas ambientais sustentáveis serão a norma.
As exigências internacionais com relação ao ciclo de vida dos produtos, já se mostram presentes na cadeia da carne com o SISBOV, Sistema Brasileiro de Identificação e Certificação de Origem Bovina e Bubalina criado pela Instrução Normativa Nº 1 de 09 de janeiro de 2002 do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, MAPA, para garantir a segurança dos produtos de origem bovina e bubalina. A questão do desempenho ambiental, esta cada vez mais presente como mostram as iniciativas tecnológicas de avaliação da emissão do gás metano, e a preocupação com a degradação de áreas de pastagens.
Portanto, a continuidade do crescimento das exportações brasileiras depende da capacidade da cadeia produtiva nacional de atender às exigências do mercado externo. Neste contexto a certificação deverá crescer em importância. Muitos frigoríficos exportadores já estão se adaptando a requisitos de clientes específicos no que diz respeito à série ISO 14000, o que termina por impulsionar toda a cadeia na mesma direção. Entretanto, um questionamento precisa ser feito: se a adesão a padrões internacionais é "determinada" pelo mercado, como alertava professor Milton Santos, e não "voluntária", como querem nos fazer crer, até que ponto bandeiras ambientalistas não estarão sendo usadas para "disfarçar" interesses políticos-econômicos internacionais e, portanto, para submeter países como o nosso às leis do mercado global?
José Caetano Ricci de Araújo
Eng. Agrônomo e Produtor Rural
Ipirá-Bahia
Referências bibliográficas
1.             SANTOS, Milton - A Natureza do Espaço.
2.             MARTÍNEZ, Osvaldo. O livre comércio: raposa livre entre galinhas livres
3.             CASTRO, Diego; CASTILHO, Selene; BURNQUIST, Heloísa. O comércio e meio ambiente – as diversas faces desse binômio.
4.             BUAINAIN, Antônio Márcio e Batalha - Cadeia Produtiva da Carne Bovina.
5.             VIANA, Ana Carolina e NOGUEIRA – ISO 14000, Comércio Internacional e meio Ambiente.
6.             LEMOS, Renato Nunes; SCHENINI, Pedro Carlos; SILVA, Fernando Amorim da. ISO 14000 E SGA – sistema de gestão ambiental.
7.             LEMOS, Haroldo Mattos de. As normas ISO 14000 e as NBR ISO 144000. [S.l.: s.n].

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