10 de out. de 2011

ANIMAIS E TRÓPICOS


A Bahia Red Sindhi agradece ao amigo e colaborador Sérgio Augusto Villas Bôas de Menezes que, gentilmente, nos cedeu este material.


Trechos extraídos do Relatório da Missão de Estudos a Espanha, Itália, Índia e Paquistão editado em novembro de 1968 pelos Professores: José Maria Couto Sampaio (′), Osvaldo Bastos de Menezes (″) e Fúlvio José Alice (‴).


Razões e motivos da missão de estudos


Por efeito mesmo dos ciclos sucessivos de civilização, grandes partes dos países localizados nos trópicos foram descobertos e colonizados por povos de climas temperados, que procuraram trasladar para novas colônias, como o Brasil, suas experiências. Nada mais natural ou lógico.

No caso de introdução de animais e plantas, aqui como alhures, a iniciativa só vingava ou só vingou, quando ela se adaptava ao clima. Especialmente, no caso dos animais domésticos, a experiência brasileira é mais do que afirmativa, pois prova dos dois lados o “fracasso” do gado europeu e o sucesso do indiano nos trópicos.

Alias, nesse episódio deve-se realçar que o Governo tem sido negligente, jamais importando diretamente animais para seus centros de pesquisa, e a vez que o realizou, na época da introdução do Red Sindhi, se deveu única e exclusivamente à obstinação de um homem, o Dr. Felisberto de Camargo que , já na índia, foi chamado de volta ao Brasil, e ameaçado até de demissão do serviço público. É certo que estes animais ai estão pelo Brasil a fora, e não trouxeram ou introduziram qualquer doença maior, como não trouxeram, também, as varias outras introduções dos particulares, que se somam, talvez em numero, superiores a trinta.

O que vimos nesses países é grande demais para ser diminuído, ou desprezado, e em nome do bem nacional, se reticências, por cima de ou dos grupos brasileiros, ou outros, é que vamos dizendo desde logo, nos umbrais deste documento, que o País se prepare, se organize, governos e particulares, para a importação correta de búfalos e zebus, já que essa é a grande controvérsia, que, de inicio , é preciso definir, e o fazemos já aqui, sem cerimônia, para darmos a tônica da nossa opinião.

A índia, por exemplo, e só para situar um aspecto que muita gente desconhece, possui um primoroso serviço de veterinária, com mais de 35.000 ajudantes veterinários diplomados em cursos objetivos de um ano, e um corpo técnico de mais de 12.000 médicos veterinários, milhares dos quais portadores de diplomas de pós-graduação em “Master od Science” e “Philosophy Doctor” conquistados na Europa, nos Estados Unidos, ou no País em suas 20 Faculdades de Veterinária (que diplomam mais de 1.000 médicos-veterinários por ano) ou nos Institutos Especializados, muitos estabelecidos nestes últimos anos.


 Zebuínos

Apreciação sobre o criatório oficial

Para a apreciação do zebu da índia e do Paquistão, tivemos oportunidade de conhecer não só o criatório particular, como também as mais importantes fazendas oficiais.

LIVESTOCK EXPERIMENT STATION MALIR – KARACHI – PAKISTAN

Está localizada a 12 milhas da cidade de Karachi, em zona árida e quente com apenas 7,85 polegadas de chuvas anuais. Foi fundada em 1921 pelo governo da Província de Sindicom com a finalidade de selecionar e preservar a raça Red-Sindhi. Em 1932 por deficiência de recursos financeiros foi fechada, sendo que parte do gado foi passado para Mirpurkhas Fruit Farm. Contudo o trabalho foi reiniciado ainda pelo governo de Sind em 1938, e no ano de 1950 foi definitivamente transferida para o governo do Paquistão. Em resumo, são perseguidos no momento os objetivos seguintes na seleção de raça:

a) Preservar a pureza racial;
b) Sentir a potencialidade como produtora de leite, eliminando inclusive a presença da cria durante a ordenha;
c) Eliminar defeitos, e como mais importantes, os úberes, conformação, patas e aprumos;
d) Reduzir a idade do 1º parto e o período seco;

c) Produzir touros superiores para melhoramento do gado local.

O rebanho de Malir tem 360 animais no seu total incluindo machos e fêmeas de diferentes idades, dos quais 120 vacas em lactação. A média de produção de leite por lactação é de 4.443 libras (2.039 quilos) com 4,5% de gordura em 274 dias. O dado mencionado é conseqüência do estudo de 305 lactações, que mostra as seguintes freqüências de acordo com as produções obtidas.

O período seco é de 160 dias em média, e o intervalo entre partos é de 434 dias. A idade para o 1º parto é de 40 (quarenta) meses. O Sind é gado de pequeno porte, pesando touros e vacas adultas em média 500 e 300 quilos vivos, respectivamente. São animais lindos na sua cor vermelha e embora de porte reduzido, são de uma robustez impressionante. Foi das raças vistas uma das que mais nos impressionam. Pelo seu porte reduzido e alta produção de leite, acreditamos ser bem econômica para áreas com menos disponibilidades de forragens. No rebanho de Malir, atualmente, a ordenha é feita sem bezerro,
ajustando-se as vacas muito bem a esse sistema de ordenha. Produz também animais de trabalho fortes e muito mansos. É das raças que deveriam ser trazidas para o Brasil com prioridade, visando a diversificar os complexos genéticos, para atender às suas necessidade de país com grande extensão territorial.

Manejo do Zebu na Índia
Na índia cada raça esta restrita a uma determinada região, embora o País não possua cercas e o criatório se processe a campo aberto. Assim é que a zona do Nelore predomina quase que exclusivamente esta raça, na do Kankrej ela é absoluta e assim por diante. A principal razão para que isso aconteça prende-se à tradição local de criação deste ou daquele agrupamento étnico já ajustado para a sua condição ecológica e, também, porque os rebanhos estão sempre vigiados por pastores durante dia e noite. Desse modo compreende-se a preservação do estado de pureza, através dos séculos, mantida nas diferentes raças.

De um modo geral os rebanhos são pequenos e constituídos de 1 (uma) ou 2 (duas) dezenas de animais. O gado vigiado pelos seus donos, passa o dia nos campos em pastoreio fiscalizado, aproveitando áreas do campo desocupadas, áreas de culturas recém-colhidas, ou o pasto que nasce margeando estradas ou canais de irrigação. À noite, esta sempre preso nos quintais das residências ou em áreas adjacentes, e também em alguns casos permanece nos próprios campos junto aos pastores.

A alimentação encontrada nos campos muito escassas, não só pelo aproveitamento de grandes áreas para a agricultura – a índia destina à agricultura 41% de sua área -, como também pelo excesso de população animal – zebuínos, búfalos, caprinos e ovinos, cujo total global é calculado em 300 milhões. Em realidade é à, quando preso que o gado tem o seu maior quinhão de alimento, dependendo a sua qualidade e quantidade de recursos do proprietário, e se constitui de concentrados e feno de gramíneas. Como a manutenção é onerosa, são conservados de preferência os animais que mais produzem leite, o principal produto do gado explorado pelo Indiano. Animais menos produtivos, ou são levados ao abate ou criado exclusivamente a campo, muitos deles sucumbindo por ocasião das grandes secas. Assim, justifica-se sempre alguma tendência leiteira nas vacas importadas. Na índia, temos a impressão de que só galinha escapa ao interesse do indiano em  exigir dos seus animais contribuição cotidiana do leite.

Como o regime alimentar em muitos casos não é bom, uma grande parte do gado carece de porte, evidenciando na idade adulta seqüelas -  conseqüência daquele tratamento. Entretanto, mesmo não estando o indiano por motivos religiosos interessado na seleção do seu gado para corte, há simultaneamente à seleção leiteira, uma outra para obtenção de bois para trabalho, justificando o que se vê em inúmeros animais, isto é, muito tamanho poça excepcional conformação. É um processo de seleção sem novidades de ordem técnica, embora os touros sejam escolhidos em muitos casos pela pureza racial, pela produção de leite das suas vacas-mães e ainda pelo se tamanho e robustez. O fato é que são encontrados animais notáveis nas diferentes raças, que do nosso ponto de vista, acreditamos, beneficiariam ainda muitíssimo a nossa pecuária.

O indiano está sempre interessado na preservação da pureza racial do seu gado. A maioria das vezes os proprietários não dispõem de touros, mas, mesmo assim, sempre buscam um reprodutor da raça idêntica ao de seu rebanho para os acasalamentos. Tivemos oportunidade de assistir por várias vezes como se processam. Estudando a fêmea em cio, leva o seu gado para junto de algum lote que possua touro para efetuação da cobertura. Pode ser ou não, paga, dependendo das relações existentes entre o proprietário do touro e o da fêmea acasalada. Como todo o rebanho está 24 horas por dia vigiado pelos pastores, dificilmente os acasalamentos se processam sem o olho deste, e é comum proprietários que, sem escrita zootécnica, dão com detalhe toda genealogia do seu gado.
O Zebu da Índia e Paquistão e o Brasil

Assim, o conhecimento do zebu indiano permitiria também dar a nossa colaboração à controvérsias ora existente, ou seja, os detalhes em torno da pergunta: tem ou não a índia reprodutores capazes de trazerem melhoramento ao nosso rebanho? Depois da visita àquele país, percorrendo numa viagem de 30 (trinta) dias os pontos mais escondidos do seu território, compreendemos algumas das razões que motivaram diferenças de pontos de vista sobre o seu rebanho e externadas por todos aqueles que tem visitado o pais. “A priori”, podemos afirmar que nas raças Gir, Nelore e Krankrej, raças acertadamente escolhidas, aceitas e selecionadas no Brasil, e mais outras com destaque a Red Sindhi e a Sahaval, possuem e podem a Índia e o Paquistão, na nossa maneira de ver, fornecer ao pais animais excepcionais.

Nos animais vistos das diferentes raças, encontramos inúmeros fortemente caracterizados, de bom tamanho e excelente conformação e que acreditamos serem do mais alto interesse para o rebanho brasileiro. Propositalmente colocamos em primeiro lugar a caracterização, pois se bem que a seleção deva ser também funcional, o propósito étnico nunca perderá atualidade, estando ao nosso ver o criador brasileiro certo, quando escolhe para o seu rebanho reprodutores raçudos dentro da raça. O Brasil, que chegou a uma situação privilegiada nas raças Gir, Nelore e Kankrej, não poderá, sob pena de estar cometendo verdadeiro crime, abandonar as características raciais do seu gado, para caminhar em direção á seleção de um tipo mestiço com o Brahman norte-americano. Somos antes de tudo racistas, se bem saibamos estar o nosso ponto de vista em oposto ao que no momento é defendido por muitos. Seleção funcional não resta a menor dúvida, mas, paralelamente raça, pois, do contrario, caminhamos para a formação de mestiços, o que não nos falta por esse Brasil afora. O que queremos e defendemos com prioridade é a preservação do estado de pureza, o que em nada impede os trabalhos para o aumento da carne e leite. No dia em que o País desprezar a seleção racial, para seguir exclusivamente o critério da seleção funcional, nesse dia entramos em situação de descrédito, como possuidores do melhor zebu do mundo.

Reconhecemos a não correlação existente entre caracterização racial e caracteres de ordem econômica, mas, mesmo assim, não podemos deixar de lembrar que a própria caracterização pode indicar diferentes capacidades de ajuste para diferentes regiões ecológicas, se na escolha das raças, para diversos locais do País, observamos a sua origem na própria Índia. É comum ouvir-se dizer e consulte-se o criador cearense que o Kankrej é das raças indianas a mais resistente a seca. Conheça-se a sua origem na Índia, visite-se o deserto de Kutch, e encontraremos as razões para tal afirmativa. Dizem ainda os criadores que o Nelore “encabrita” ou diminui de tamanho quando é criado em terras pobres. Analise-se o seu grande tamanho e a sua origem indiana como raça proveniente de terras férteis e teremos exatamente a resposta. A observação do criador brasileiro é dado quase tão valido quanto o obtido da pesquisa, e difere da segunda por concluir partindo da observação de muitos anos, mas em segurança ambos são corretos.

(′)Eng. Agrônomo, M.S., Professor da Escola de Agronomia da Bahia, Universidade Federal da Bahia e da Seção de Zootecnia do Instituto de Pesquisas e Experimentação Agropecuária do Leste, Ministério da Agricultura.

(″)Eng. Agrônomo, M.S., PhD. (Prel.), Professor da Universidade Rural Federal do Rio de Janeiro, Ex-Diretor Geral do Departamento de Pesquisas e Experimentação Agropecuárias do Ministério da Agricultura, Biologista do Instituto de Pesquisas e Experimentação Agropecuária do Centro-Sul, Ministério da Agricultura.

(‴) Médico Veterinário, M.S., Professor da Escola de medicina Veterinária, da Universidade Federal da Bahia, Fundador e Ex-Diretor do Instituto Biológico da Bahia, Ex-Secretário da Agricultura da Bahia (Parte da viagem compreendida pela Índia e Paquistão).

2 comentários:

  1. Eduardo Aguiar de Almeida18 de outubro de 2011 às 14:03

    Parabéns aos amigos do Sindi por essa brilhante iniciativa. Sensacional! Muito bom divulgar "Animais e Trópicos" pela net.

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