16 de jan. de 2021

ÁRVORES DA CAATINGA DE INTERESSE PASTORIL

Por João Ambrósio de Araújo Filho

A vegetação lenhosa da caatinga, em sua maioria formada por espécies caducifólias no período seco, adiciona ao solo cerca de quatro toneladas de matéria seca de folhas e galhos, contribuindo, assim, com um papel fundamental na reciclagem de nutrientes. Além disso, cerca de 70% das espécies lenhosas de alguns sítios ecológicos participam da dieta de bovinos, caprinos e ovinos. A manipulação dessas espécies, seja para a melhoria da qualidade e para o aumento da produção de forragem, seja para uso de sua fitomassa foliar como adubo orgânico, requer um conhecimento adequado das características da produção e da composição química de sua fitomassa. Como esses fatores se relacionam com o ciclo fenológico das plantas, servem também como base para determinação da melhor época de sua utilização. As espécies lenhosas da caatinga apresentam diferenças estacionais em seus ciclos fenológicos, possivelmente associadas a flutuações da composição química de sua folhagem. Vale salientar que a riqueza florística forrageira da caatinga é pouco conhecida, dificultando a seleção de espécies com potencial para utilização em sistemas agroflorestais ou como forrageiras. Essa deficiência de conhecimento contribui para a prevalência de um manejo da vegetação puramente extrativista, carecendo de práticas e tecnologias adequadas ao aporte de uma base de sustentabilidade à atividade pastoril e agroflorestal nos ecossistemas da caatinga. As características anatômicas, morfológicas e fisiológicas estão associadas aos mecanismos de adaptação das espécies lenhosas às condições de seca das regiões semiáridas. Porém, em se tratando de árvores e arbustos, dois mecanismos se destacam: a resistência e a tolerância. As espécies lenhosas com mecanismo de resistência à seca são perenifólias e apresentam folhas pequenas ou folíolos, céreos ou rugosos, superfície foliar ondulada, com os estômatos localizados na parte côncava, espinhos ou acúleos, caules com vasos lenhosos curtos e de pequeno diâmetro, com paredes espessas, sistema radicular profundo e extenso. Nas regiões semiáridas tropicais essas espécies botânicas são predominantemente do tipo C3 ou crassuláceas. Por outro lado, as árvores e os arbustos, com mecanismo de tolerância, são caducifólios e possuem geralmente folhas grandes, tenras e lisas, podendo ter espinhos, caules com vasos lenhosos longos de grande diâmetro, sistema radicular lateral extenso e, nos trópicos semiáridos, são espécies botânicas geralmente do tipo C4. A combinação variável dos fatores supracitados resulta em diversidade de situações que caracterizam os diferentes graus de adaptação das espécies arbóreas e arbustivas da caatinga às condições do Semiárido nordestino. O mecanismo de tolerância apresenta-se como o mais comum entre as espécies lenhosas da caatinga, possivelmente por permitir uma melhor adaptação às características da variabilidade das precipitações pluviais da região. Algumas das espécies botânicas, de maior interesse serão descritas a seguir.

Aroeira (Myracrodruon Urundeuva)

Da família das Anacardiáceas, a aroeira (Figura 15) é uma árvore típica dos estágios finais da sucessão secundária da caatinga, encontrada nos sertões nordestinos de baixa a elevada altitude, na maioria dos solos da região, com predominância nos luvissolos crômicos órticos, latossolos e argissolos. Árvore que pode alcançar até 25 m de altura, de crescimento moderado, sistema radicular com raiz pivotante pouco pronunciada, caule inerme, lenho pesado, com densidade específica de 900 kg/m3. Caducifólia precoce, copa arredondada moderadamente densa e folhas compostas. Seu ciclo fenológico se verifica ao longo de todo o ano. Durante a época das chuvas, a planta inicia com a rebrotação, permanecendo em vegetação plena até o fim do período, quando perde sua folhagem. Ao meio da época seca entra em floração e frutificação, totalmente desprovida de folhas, completando, então, seu ciclo fenológico. Planta útil como forrageira, produtora de madeira para construção e lenha, medicinal e utilizada na coleta apícola de pólen e néctar. Análises laboratoriais da folhagem da aroeira, colhida nas fases de vegetação plena e dormência (Tabela 2), indicaram que o teor médio de matéria seca é de 38,5%, na fase de vegetação plena, alcançando, na dormência ou restolho, cerca de 89,6%. O teor de proteína bruta decresceu de 16,7%, na fase de vegetação plena, para 8,7%, na dormência. A fibra em detergente neutro e a fibra em detergente ácido apresentaram valores sempre baixos, flutuando a primeira de 20,5 a 36,5% e a segunda de 11,1 a 21,7%, respectivamente, para as fases de vegetação plena e de dormência. O teor de lignina alcançou 4,5%, na vegetação plena, aumentando para 6,7%, na dormência, um dos menores entre as espécies arbóreas da caatinga. Por outro lado, o percentual de taninos totais foi sempre o mais elevado, variando de 35,8, na fase de vegetação plena, a 10,5, no restolho lenhoso. Por fim, a digestibilidade in vitro da matéria seca (DIVMS) pode ser considerada elevada para uma arbórea nativa, variando de 65,6% na fase de vegetação plena para 30,5% na dormência.

As folhas da aroeira são consumidas, verdes ou secas, por bovinos, caprinos e ovinos. É uma arbórea que não deve ser rebaixada, mas devido a sua utilidade como produtora de madeira e de produtos medicinais, é preferível preservá-la. Seu aproveitamento pela pecuária deverá ser pelo uso de suas folhas naturalmente fenadas. Sua contribuição para a circulação de nutrientes em um sistema agroflorestal é muito importante, considerando-se o elevado teor de nitrogênio em suas folhas e a rapidez com que se degradam, após sua queda ao solo.


Catingueira (Poincianera pyramidalis)

Da família das Cesalpináceas, a catingueira (Figura 16) é uma árvore típica dos estágios intermediários da sucessão secundária da caatinga, encontrada nos sertões nordestinos de baixa a elevada altitude, na maioria dos solos da região, com predominância nos luvissolos crômicos órticos e argissolos. Árvore que pode alcançar até 10 m de altura, de crescimento lento, sistema radicular com raiz pivotante pouco


pronunciada, caule inerme, lenho pesado, com densidade específica de 920 kg/m3. Copa arredondada moderadamente densa e folhas compostas. Caducifólia tardia, seu ciclo fenológico se verifica durante a época das chuvas, com o início da dormência em plena estação seca. Alcança a vegetação plena no começo da estação das chuvas, flora ao meio da estação e frutifica ao final do período úmido. Planta útil como forrageira e produtora de néctar e pólen e de lenha.

Análises laboratoriais da folhagem da catingueira, colhida em diferentes fases de seu ciclo fenológico (Tabela 3), apontaram um teor de matéria seca que se mantém sempre elevado, acima de 40%, alcançando, na fase de dormência (restolho), cerca de 87,1%. O teor de proteína bruta, por seu turno, decresceu de 16,9% na fase de vegetação plena para 14,4% na frutificação e para 11,2% na dormência. A fibra em detergente neutro e a fibra em detergente ácido apresentaram valores sempre baixos, flutuando a primeira de 31,9 a 49,8% e a segunda de 19,8 a 33,4%, respectivamente, para as fases de vegetação plena e de dormência. O teor de lignina alcançou 6,6% na vegetação plena, aumentando para 12,7% na frutificação e decaindo para 11,7% na dormência, um dos menores entre as espécies arbóreas da caatinga. Por outro lado, o percentual de taninos totais foi sempre muito elevado, variando de 20,6 na fase de vegetação plena a 9,5 na dormência. Por fim, a


digestibilidade in vitro da matéria seca pode ser considerada elevada para uma arbórea nativa, variando de 58,4%, na fase de vegetação plena, para 50,4%, na frutificação, atingindo 30,9% na dormência. As folhas da catingueira têm consumo insignificante quando verdes, devido, provavelmente, ao odor desagradável que possuem. Porém, quando secas, são consumidas por ovinos, caprinos e bovinos, participando em até 35% de suas dietas no período seco. A catingueira é uma arbórea que não deve ser rebaixada, podendo, no

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