1 de abr. de 2016

O SERTÃO FRUGAL E VERDADEIRO –CRÔNICA DE UMA CONVICÇÃO

A busca de elementos biológicos e conhecimentos apropriados
Artigo de Manoel Dantas Vilar Filho
 
À GUISA DE INTRODUÇÃO:
A seca e a extravagância de seu destratamento
...não há graça nenhuma em se sentir num 
batalhão, com o passo desencontrado... 
Sei que mantenho, lá por dentro, a humildade 
dos apaixonados e que, enfim, devo ter os 
defeitos e as virtudes da Raça a que pertenço:
 a dos nordestinos temperados na teimosia 
contra a dificuldade...
É muito desgastante ter de fazer as coisas apesar de e não há graça nenhuma em se sentir num batalhão, com o passo desencontrado. Por isso, falando sobre esses assuntos da Seca, corro o risco de ficar enfático ou maçante. Se o for, me perdoem; é um exagero natural dos crentes, mesclando a impaciência de quem resiste ao desencanto. Sei que mantenho, lá por dentro, a humildade dos apaixonados e que, enfim, devo ter os defeitos e as virtudes da Raça a que pertenço: a dos nordestinos temperados na teimosia contra a dificuldade, escorados na fidelidade a si mesmos e ao seu mundo cheio de despojamentos. 
O que aprendi foi em alguns livros e através de continuada observação, na reflexão e na ação dedicadas exclusivamente ao Cariri das secas, onde a dimensão do real aniquila qualquer frivolidade, até por cima do sofrimento sem medida e sem consolo - além da fé - do seu povo.
Nessa contramão do roteiro clássico da 
migração dos nordestinos, desenvolvi com o 
semi-árido uma relação intensa, funda e 
inevitável, e, tanto melhore a nitidez dos 
caminhos, cresce uma forma de tristeza, 
ao digerir o contraste entre o viável 
de fazer e o que se faz, sendo
 a lógica, como é, a ética do intelecto.
Vou escrever como quem tenta contar de experiência vivida, pensando em acrescer alguma informação a outro que, como eu, até por lealdade às suas raízes, queira envolver o tempo da mente e da carcaça, com esse mundo áspero, bonito, possível e mal tratado da zona seca. Daí, talvez, o tom pessoal mais acentuado de algum trecho, sobretudo quando não consigo esconder travos de rigor e do pecado da ira, que, por mais que não quisesse, foram aderindo à minha expectativa. Coisa de convertido em monomaníaco, que procura se compensar dessa condição, se valendo da cortesia da clareza e da vantagem de não atropelar a mania de outros.
Devo chamar esse texto de sumário das veredas - longas e cheias de voltas, como o texto - por onde fui me aconselhando, nesses trinta e tantos anos, desde que larguei as atividades urbanas de Engenharia e Universidade e assumi, por morte desavisada do Pai, em tempo e empenho integrais, o cuidado da Fazenda, sem considerar isso uma condenação. Nessa contramão do roteiro clássico da migração dos nordestinos, desenvolvi com o semi-árido uma relação intensa, funda e inevitável, e, tanto melhore a nitidez dos caminhos, cresce uma forma de tristeza, ao digerir o contraste entre o viável de fazer e o que se faz, sendo a lógica, como é, a ética do intelecto.
Especialistas classificam as Secas em meteorológicas - periódicas e típicas de cada região, hidrológicas - baixas precipitações eventuais em qualquer clima e sócio-econômicas - resultantes da associação entre perda de bens de produção e qualquer das duas anteriores.
A Seca é uma característica normal e recorrente 
do Clima, diferindo de outros riscos naturais por 
sua lenta maturação, sem a ostensividade 
repentina das enchentes ou dos terremotos.
A Seca é uma característica normal e recorrente do Clima, diferindo de outros riscos naturais por sua lenta maturação, sem a ostensividade repentina das enchentes ou dos terremotos. É o mais complexo e o menos compreendido deles, afetando maior número de pessoas que qualquer outro. Difere da aridez, que é situação plena, e seus efeitos vão se acumulando progressivamente, perdurando anos após sua finalização. Não é mais assunto da Defesa Civil e da Caridade Pública, em boa parte do mundo onde ocorre.
Aqui, ainda lhe tratam como uma espécie de azar seu de um pedaço do Brasil, onde persistentes fatalistas teimam em morar e para quem, tecnocratas e políticos, seduzidos por uma posição intelectual mais fácil e de fazer mais simples, se limitam a masturbar-se na molhação artificial da terra para pensar em produção, indiferentes ao conflito entre o mundo real e esse comodismo do cérebro. Ainda não resolveram o problema de áqua para beber o uso primordial e sem sucedâneo que água tem e que é de solução sabida e accessível.
A intempestividade das chuvas do NE e seu regime distributivo, caracterizam uma região de clima singular, caprichoso, não compatível com equações de 1° grau na sua abordagem e, por conseqüência, com plantas e animais que sejam lineares nas suas condições para crescer e produzir. E nem com gente que tenha como baliza de pensamento, um cartesianismo derivado de climas regulares e coisas mansas.
.Um Ensaio estatístico desenvolvido no CTA (Carlos Girardi e Luís Teixeira) em 1978, evidenciou dois tipos básicos de Secas no NE, além dos oito ou nove meses sem chover, normais, de cada ano: um período radical, isolado (ciclo de 13 anos), inserido num tempo relativamente chuvoso (1866, 1915, 1942 e, depois, 1993),
A leitura política do par de curvas que desenham a análise 
e a projeção da série estatística do CTA, revela curiosas 
circunstâncias e constatações de muita valia para se entender
 o que já houve e porque continua sem haver providências 
sistemáticas... para acudir, efetivamente, o problema e o povo...
(Fonte desta imagem: http://livros01.livrosgratis.com.br/ut000004.pdf)
e outro, um encadeamento de anos brabos - as, até então, chamadas Grandes Secas - em intervalos aproximados de 26 anos, onde dois são particularmente ruins e o número do pior grava na lembrança regional a dureza do conjunto. Os ciclos foram: 1873/78, com secas máximas em 1877 e 1878; o segundo em 1900/07, com as maiores em 1900 e 1907; um outro 1927/33, com o pico em 1931 e 1932 e o seguinte, 1951/58, com o pior em 1953 e 1958. O último, o imediatamente previsto pelo CTA, foi de 1979 a 1983, com as maiores secas em 1981 e 1983. Há poucos dias, incluindo os dados de 1978 até 2000 e afinando o tratamento matemático da nova série, demarcaram um novo período mínimo a partir de 2003.
Em Taperoá, as medições desde 1911,
indicam: média anual de 584 mm,
mínimo de 97 e máximo de 2030 mm
.No Cariri Velho da Paraíba (1/3 do território estadual), quando há variação dessas probabilidades é, sempre, para pior, além dos que seriam anos atípicos da série, como 1898, 1919 e depois 1998, que foram de terríveis secas gerais. Em Taperoá, as medições desde 1911, indicam: média anual de 584 mm, mínimo de 97 e máximo de 2030 mm, distribuídos em 42 dias/ano com alguma chuva, sendo apenas 14 com chuvas maiores que 10 mm. Às vezes há somente 5 dias/ano com chuvas maiores que 10 e caem aguaceiros de 150/200 mm numa mesma noite. Além disso, o 1° dia do tempo molhado, oscila desde 9 de dezembro do ano anterior até 29 de abril e o final é, também, volúvel. Creio que essa é a realidade ambiental básica de todo o semi-árido, peculiarizando essa semi-aridez, o que, entre outras coisas, desvaloriza o decalcado conceito de altura anual de chuva como padrão para avaliar o bom, o ruim, e o que fazer. No centro-sul da França, por exemplo, os seus 600 mm anuais, caem em 183 dias.
Nenhum governante nordestino incluiu, até hoje, 
nos seus planos de mandato, se ocupar assiduamente
 com a Seca, apesar da assiduidade com que 
ela ocorre, sendo, a partir desse ensaio e da 
evolução posterior do conhecimento (El Nino, 
La Nina; oscilação de temperaturas do 
Atlântico, etc); até, previsíveis;

.A leitura política do par de curvas (desenhos e outros comentários anexos) que desenham a análise e a projeção da série estatística (1849-1978) do CTA, revela curiosas circunstâncias e constatações de muita valia para se entender o que já houve e porque continua sem haver providências sistemáticas - como a Seca é - para acudir, efetivamente, o problema e o povo:
.Cada estio maior é quem gerou, depois de acontecido, alguma iniciativa de Governo em relação às secas, sempre em tom peremptório e pretensão definitiva;
.Essa formulação espasmódica é deslembrada ou esvaziada, assim que volta a chover, até que nova seca venha emocionalizar as conversas, quando se improvisa outra, sob a mesma retórica, a mesma inconsistência e a mesma transitoriedade, ainda hoje;
.A visão hidraulicista (água como fator de produção faltante/excludente) da

Pensamento do mês